Mas, de fato, qual é o trabalho do médico do esporte?
Evidente que a Medicina do Esporte tem um foco no manejo de atletas, em seus acidentes de trabalho e na performance dessas pessoas.
Definir condutas em eventos agudos, como concussões ou no tratamento de lesões musculares que geram o afastamento do atleta de suas atividades, faz parte do dia a dia desse profissional.
Inclusive, o termo “medicina do esporte” tem sua origem nessa vertente da especialidade, e reflete parte do trabalho desse profissional.
Apesar disso, hoje em dia, o termo “medicina do exercício e do esporte” é o correto a ser utilizado, já que é uma área que abrange as práticas de exercícios e não apenas as esportivas e de alta performance.
O médico do exercício e do esporte atua desde a indicação da prática de atividade física até o acompanhamento dos resultados, prevenção de lesões e ao contraindicar a determinados pacientes.
Então, será mesmo que o médico do esporte trabalha só com atletas de alta performance?
Esse é o principal pensamento equivocado das pessoas sobre a especialidade! A medicina esportiva tem um papel muito maior na vida de pacientes não atletas, que são a maioria da população.
Atualmente, as maiores causas de morte no mundo são as doenças cardiovasculares, seguidas de perto por diabetes, doenças endócrinas e distúrbios metabólicos.
E o que esses pacientes têm em comum?
A primeira tentativa de manejo no início de muitas dessas doenças são as famosas mudanças de estilo de vida, e é nesse ponto que a medicina esportiva se encaixa. Não só no tratamento, como na prevenção!
Hipertensão (1ª), hiperglicemia (3ª), obesidade (4ª) e hipercolesterolemia (5ª) estão entre os 5 maiores fatores de risco que levam a óbito segundo o IHME (Institute for Health Metrics and Evaluation) da Universidade de Washington.
E o que esses fatores de risco têm em comum? Todos são reduzidos e prevenidos pela prática de exercício físico. Ou seja, todo médico deve ter conhecimento em medicina do exercício e do esporte para poder prescrever uma atividade física de forma adequada aos seus pacientes.
Além dos exemplos desses pacientes, será que temos mais especialidades em que a medicina do exercício e do esporte se faz presente?
Vamos pensar em um paciente idoso, e em sua família que está preocupada com o risco de quedas. Entre as principais causas de queda estão a parte funcional ( exemplo, levantar de cadeiras, marcha e equilíbrio), tônus, postura, deformidades articulares, e todas são causas em que a medicina do exercício é capaz de interferir para então diminuir os riscos de queda.
Agora um paciente mais jovem, estressado com rotina de trabalho, e problemas familiares, que abre um quadro depressivo. Uma das principais terapias não farmacológicas é justamente a prática de atividade física. Ou seja, a medicina do exercício e do esporte pode influenciar, ser terapêutica e exercer papel preventivo em diversas áreas da medicina.
Como prescrever uma atividade física para o meu paciente?
Idealmente, a prescrição de uma atividade física deve conter exercícios que possuam componentes aeróbicos, de força e de mobilidade. O mnemônico FITT (Frequência, Intensidade,Tempo, Tipo) nos guia sobre o que devemos escrever na prescrição.
Frequência do Exercício:
Sempre que possível, recomenda-se 3 ou mais dias por semana de atividade física. Porém, quando não for, estudos comprovam que realizar o mesmo tempo em menos dias produz resultados semelhantes. Exemplo, ao invés de 3 dias de exercício físico, 150 minutos em um dia só.
Apesar disso, ocorre o aumento do risco de lesões, e os resultados de adesão e perda de peso são maiores em quem realiza repetidas sessões de exercícios curtos comparados com quem realiza uma sessão contínua.
Intensidade do Exercício:
Aumentar a intensidade do exercício traz resultados semelhantes em um tempo menor. Por exemplo, 15 minutos de corrida tem benefício similar a 30 minutos de caminhada.
Uma forma de medir a intensidade do exercício é o “teste da conversa”. Se a pessoa tem dificuldades para cantar, mas consegue conversar durante aquela atividade, este é um exercício de moderada intensidade.
Se a pessoa tem muita dificuldade para conversar, a atividade é considerada de alta intensidade.
Tempo do Exercício:
O Guideline de Atividade Física de 2018 recomenda 150 minutos de exercícios de moderada a alta intensidade por semana, sendo que em 2 dias devem ser feitos exercícios de força muscular.
Apesar disso, estudos mostram que 3 séries de 10 minutos de exercício por dia equivalem em benefícios para saúde a uma série de 30 minutos de atividade de moderada intensidade.
Um estudo com 400.000 pessoas concluiu que 10 minutos de exercício de moderada intensidade por dia reduz em 10% fatores de risco de mortalidade. Ou seja, se tratando de exercício, cada minuto conta positivamente para a redução de fatores de risco.
Por outro lado, a redução de mortalidade máxima atingida com atividade física regular e vigorosa foi de 45%, observada em indivíduos que realizam entre 40 e 50 minutos de exercício por dia.
É improvável que mais de 100 minutos de atividade diária impacte na redução de mortalidade, já que exercícios físicos vigorosos em excesso podem ser prejudiciais.
Tipo de Exercício:
A caminhada é o exercício mais comumente prescrito para pessoas que estão começando uma atividade física: por ser simples, não necessitar de equipamentos e poder ser medida facilmente em tempo ou distância. Os guidelines atuais recomendam que um adulto atinja 7000 a 10000 passos por dia.
Outros exercícios aeróbicos também podem ser indicados na impossibilidade de caminhadas (Ex: canelite ou lesões que pioram com impacto), como pedaladas, hidroginástica, aulas de dança, e produzem resultados similares quando comparados a caminhadas realizadas no mesmo período.
Um exemplo de prescrição para um paciente não sedentário iniciando atividade física:
-Frequência: 3 a 4 dias por semana
-Intensidade: moderada
-Tempo: 30 minutos
-Tipo: caminhada rápida + 10 agachamentos sem peso + prancha por 30 segundos
Como aumentar a adesão dos pacientes a atividade física?
Assim como garantir que a adesão medicamentosa seja feita, a adesão ao exercício também encontra barreiras. A falta de tempo por rotina dedicada a família e trabalho é a principal justificativa dos pacientes para não realizarem atividade física. Algumas estratégias que podem ser eficazes na adesão dos pacientes:
-Incentivar caminhadas durante a rotina já existente do paciente. Como estacionar o carro mais longe do trabalho, andar até pontos de transporte público mais distantes, e até mesmo usar escadas ao invés de elevadores. Implementando essas pequenas atividades, uma pessoa já consegue fazer os 30 minutos diários de exercício físico preconizados.
-Incentivar a prática de atividades físicas durante os finais de semana, possibilitando atingir os 150 minutos semanais de forma gradual.
-Encontrar uma companhia para as atividades físicas se mostrou eficaz em garantir uma maior adesão.
-Aumentar intensidade dos exercícios. Exemplo, correr 25 minutos por 3 dias tem a mesma eficácia que caminhar 30 minutos durante 5 dias da semana.
-Exercícios em casa podem ser feitos de forma a economizar o tempo de deslocamento, apesar de ter o custo dos equipamentos (esteira, transport, pesos)
Quando contra indicar atividade física?
Em casos de doenças agudas ou descompensação de doenças crônicas, o exercício deve ser restrito ou limitado dependendo da situação.
Em pacientes com comprometimento de articulações, as atividade de impacto devem ser evitadas e substituídas por exercícios na água.
Para pacientes com lesões musculares, o indicado é esperar a completa reabilitação do músculo para, então, reiniciar as atividades.
fonte: Blog do Jaleko, escrita por Giovanna Martino
imagem: halfpoint, de envatoelements